quarta-feira, 9 de novembro de 2011

Os indignados de ontem e os de hoje

Maio de 1968 colheu, em parte, o mundo de surpresa. Até então se julgava que toda revolução só viria da classe operária. Os trabalhadores se tinham acomodado na onda do neocapitalismo que lhe ia melhorando a vida cada dia. Os sindicatos dialogavam com os empresários de maneira pacífica. Tudo parecia correr bem no mundo econômico. E eis que os universitários franceses desencadeiam gigantesca onda de insatisfação, depois que algo semelhante acontecera nos Estados Unidos com os hippies e outros inconformados com a sociedade.
Agora, voltam os jovens à rua. Já não vêm por razões culturais, acadêmicas como na França de 1968. Lá, a bête noire se chamava professores, estrutura universitária. Salpicaram os muros da Sorbonne com frases provocantes. "Professores, vós nos fazeis envelhecer". E alguns famosos mestres não aguentaram os vexames sofridos e abandonaram a França, indo para outros países.
As reivindicações se ampliavam para o espaço do prazer sem entraves. "As reservas impostas ao prazer excita o prazer de viver sem reserva", soava um dos slogans. Mais expressivos ainda, "gozai sem limites", "a poesia está na rua", "o sonho é realidade", "a imaginação no poder". E outra onda ia na direção da participação, da liberdade de expressão. "Ser livre em 1968 é participar". E em face do poder constituído, existia a maior suspeita. "Todo poder abusa, o poder absoluto abusa absolutamente". Em jogo fino de palavra se dizia: "a vontade geral (em francês générale) contra a vontade do General (de Gaulle)"! Nem faltou a ironia contra a Assembleia Legislativa: "Quando a Assembleia Nacional se transforma num teatro burguês, todos os teatros burgueses devem tornar-se assembleias nacionais". Numa palavra, o dito mais marcante resumiu o espírito de 1968: "É proibido proibir".
Isso foi ontem. E hoje: quem são os indignados? A maioria jovens. Já se colocam noutro horizonte. O olhar deles se enche das ofertas consumistas. O bolso escasseia, privando-os de participar, não na política, mas no consumismo. Reivindicam emprego, salários, para enfronharem-se mais na sociedade da abundância. Descobriram que a política financeira neoliberal os impede de conseguir tais objetivos. Daí se voltam contra ela. Em Nova York, milhares de manifestantes lançaram o grito: ocupe Wall Street, em protesto contra o sistema financeiro que favorece os ricos e poderosos em detrimento dos cidadãos comuns.
Visa-se ao alvo da política financeira. Nela os jovens veem o inimigo de seu bem-estar, de suas possibilidades de melhor vida. Tal movimentação já atingiu mais de 80 países. Entra em jogo fator novo que 1968 não conheceu: a mobilização pelas redes sociais. Recurso cujo alcance ainda nos escapa. Estão aí diante de nós as lutas na Tunísia, no Egito, que derrubaram os governantes. Desponta algo novo.
No Brasil apenas se deram alguns soluços, sobretudo em Brasília. Talvez o que mais indigne o povo não seja ainda a percepção da perversidade do mundo do dinheiro, mas a declarada corrupção no mundo dos políticos e suas escandalosas mordomias. O problema, porém, vai mais longe: é realmente do sistema neoliberal financeiro.

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