terça-feira, 13 de setembro de 2011

À Nossa Califórnia I: Problemas Diversos

Entramos na contagem regressiva para a V Festa do Quiabo e II Festival da Goiaba do nosso município. Faltando três semanas para a festa que caiu no gosto do povo, encontrei alguns estudos que revelam não termos muito a comemorar, ou melhor dizendo, que poderíamos ter muito mais a comemorar. Por ser um tema extenso e que merece longa discussão e mais atenção, vou dividi-lo em três artigos, os quais serão publicados a seu tempo.

Como já é de costume e de pesar, ‘estrangeiros’ sabem e estudam mais a nossa cidade que nós mesmos, os cidadãos canindeenses. Em um desses estudos, faz-se análise do (in)sucesso parcial do Projeto Califórnia.
Espelhando-se no modelo agrícola utilizado no Estado da Califórnia, Estados Unidos da América, o Governo de Sergipe implantou na década de 80 o Projeto Califórnia. Tendo como objetivo ser modelo de exploração racional dos recursos de solo e água para o semi-árido brasileiro, foram investidos milhões naquela que seria a maior obra de desenvolvimento regional daquela gestão.
Situando-se entre os municípios de Canindé de São Francisco e Poço Redondo, o Perímetro Irrigado Califórnia está subdivido em 333 lotes, apresentando área total de 3.980 hectares. O sistema possui as duas formas de exploração agrícola recomendadas para a região, agricultura irrigada e de sequeiro (resistente à seca).
Segundo pesquisas divulgadas no meio científico, dos atuais colonos do perímetro, 91,7% não participaram da implantação do projeto. Já em 1990, foi registrada a desistência de 219 colonos, cujos lotes foram repassados para terceiros. Além das dificuldades normais de exploração, problemas relacionados à omissão do poder público à época, à tradição cultural do produtor, ao domínio da nova tecnologia, ao acesso ao crédito, entre outros, estiveram na base da elevada rotatividade existente no Perímetro.
Comparando-se com outro Perímetro implantado no mesmo ano de 1987, o Jabiberi, na região sul do estado, verifica-se que 86,7% dos irrigantes desenvolvem atividades desde a sua implantação. Com essa informação pode-se constatar que, embora relevantes e merecedores de atenção, aqueles problemas citados não podem ser considerados como obstáculos intransponíveis que impossibilitem a sustentabilidade do projeto. Pelo contrário, a alta rotatividade apresentada pelo Califórnia se deve ao fato de a maioria das pessoas selecionadas para receberem os lotes quando da implantação não possuírem qualquer experiência agrícola. Embora tais lotes exijam domínio e treinamento adequados de técnicas agrícolas com irrigação. Isso torna clara a utilização da influência política para favorecimento de afilhados, contemplando com lotes àqueles que nunca manejaram a terra. Nos dias atuais, cerca de 91,7% dos produtores não possuíam vínculo com a atividade agrícola antes de adquirirem seus lotes no Perímetro.
Outro fato gritante registrado foi a ausência de acompanhamento e controle da produção por parte de alguns colonos. De acordo com levantamento realizado, 71,6% dos produtores revelaram que não realizam tal controle de forma sistemática de modo a avaliar os custos de produção. Além disso, todos os entrevistados disseram fazer uso de fertilizantes e agrotóxicos. Grande parte da utilização desses produtos é feita sem nenhuma prescrição técnica, sendo normalmente realizada de acordo com a expectativa do produtor. Isso tem sido registrado nas duas décadas de produção na região.
O volume desregrado de água aplicado vem determinando a lixiviação de nutrientes e a ocorrência de processos de erosão e salinização dos solos do Perímetro. A própria administração, realizada pela Companhia de Desenvolvimento de Recursos Hídricos e Irrigação de Sergipe – COHIDRO, admite a existência de 42 lotes com problemas de salinização, correspondendo a 2% da área total. Contudo, de acordo com observações diretas e análises químicas realizadas por terceiros, essa área pode ser ainda maior. Isso dito devido à possibilidade de não estarem sendo contabilizadas as áreas salinizadas que a COHIDRO substitui por parte da área destinada à reserva ambiental. Manobra falha e desonesta. Dos produtores, 24% já relatam estar sofrendo algum tipo de restrição na produção devido à salinização.
Relatou-se ainda acelerado depauperamento do solo por erosão e compactação. A maioria dos produtores relatou adotar apenas a rotação de cultura como forma de proteção do solo. O uso reiterado da irrigação sem maiores critérios mostra-se exagerado, o que por vezes provoca encharcamento do solo.
Fazendo-se um retrospecto, no ano de implantação do Perímetro Irrigado Califórnia verifica-se a ocupação inicial dos lotes com culturas de subsistência (milho e feijão). Nos anos seguintes ocorreu uma pulverização de culturas como abóbora, tomate, mandioca e quiabo. Este último, em 1996 já correspondia a 45,8% da área cultivada. Os dados levantados demonstram que de 1996 a 2000 o quiabo, o milho, o feijão e o tomate representavam 88% da área cultivada e respondiam juntos por 85% de toda produção alcançada.
Os estudos comprovaram o domínio da cultura do quiabo, que em 2000 já correspondia a cerca de 70% da produção do Perímetro e ocupava metade de sua área total. Entretanto, a produtividade média alcançada foi de 9.264 kg/ha, permanecendo bem abaixo da média nacional que é de 15.000 kg/ha.
Segundo alguns pesquisadores, o redirecionamento da produção no Califórnia para o cultivo do quiabo deu-se em virtude de sua adaptação à região e dos benefícios que ela proporciona: produção continuada por um período de 4 a 6 meses, colheitas intermitentes que permitem a comercialização duas a três vezes por semana; certeza da comercialização da produção colhida; adequação da cultura às características do solo e do clima aliada à facilidade no fornecimento de água pela irrigação.
Outros cientistas criticam esse direcionamento da produção e consideram que isto evidencia a fragilidade do sistema produtivo implantado no Perímetro Irrigado Califórnia. Fragilidade tal expressa na falta de visão empresarial e de vivência com a agricultura de mercado. Eles relatam que os produtores escolhem as culturas geralmente por influência dos seus vizinhos. Ao constatarem a existência de uma cultura bem sucedida, todos seguem o exemplo, saturando o mercado e barateando o produto por ocasião da colheita.
Para felicidade, aquele barateamento e consequente desvalorização da produção tem diminuído graças às consultorias fornecidas pelos atuais técnicos da administração do perímetro. Atualmente os irrigantes já produzem menos do que o mercado consome, buscando valorização do produto e maior rentabilidade. Rentabilidade tal que gira em torno de R$ 1,5 milhão anuais. Na opinião dos produtores, o cultivo de outras culturas no Califórnia é classificado como perda de tempo e prejuízo, em função do tempo de colheita, do rendimento e do preço.
Nota-se a existência de diversos problemas que podem ser causadores de um futuro colapso do sistema. Assim como ocorrido no Platô de Neópolis, Perímetro de Irrigação concebido e implantado pelo mesmo governante.
Para não dizer que não falei de flores, nos próximos artigos publicados trarei as possíveis soluções a serem tomadas para que a Nossa Califórnia seja exemplo de sucesso e sustentabilidade. Isso ocorrendo, podemos calar a boca daqueles que nos usam como motivo de chacota...
 “Investiu-se muito e hoje só se produz quiabo. ‘Ele’ pode entrar para o livro dos recordes como o caruru mais caro da história.”
(José Eduardo Dutra em referência a João Alves Filho)





Por
Denisson Santos
Tecnólogo em Petróleo e Gás - UNIT
Mestrando em Engenharia de Processos - UNIT
Aluno Pesquisador do Núcleo de Estudos em Sistemas Colidais - NUESC





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